Noir francês

A lua na sarjeta (La lune dans le caniveau, 1983), David Goodis por Jean-Jacques Beineix.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

GEORGES SIMENON

Como Maigret, seu mais famoso personagem, Georges Simenon era em si uma figura ímpar. Nascido em 1903 na Bélgica, foi para a França e se tornou um dos maiores escritores de todos os tempos. Construiu sua carreira de forma determinada, planejada, dirigida. Consciente da necessidade de criar um estilo e uma arte particulares, durante vários anos "treinou", escrevendo centenas de livrinhos obscuros de vendagem imediata, o que garantia sua sobrevivência e o obrigava a testar seus limites. Nesta época, utilizou dezenas de pseudônimos, sendo os mais freqüentes Georges Sim e Jean du Perry. Quando sentiu que estava preparado, deixou os pseudônimos e organizou O lançamento.
Foi numa sexta-feira, 20 de fevereiro de 1931, em Montparnasse, coração de Paris. Festa para o lançamento de dois romances de um novo detetive, anunciada como a Noitada Carcerária. Simenon confeccionara e espalhara pela cidade milhares de cartões postais, com frases instigantes retiradas das obras. Os "convites" eram fichas de intimação judicial com o nome do indiciado, isto é, convidado. A decoração do salão era sistemática: algemas, mãos ensanguentadas, corpos decapitados. Os porteiros estavam à caráter: uma prostituta, um cafetão e um açougueiro com um facão manchado de sangue. Pierre Assouline, um dos biógrafos de Simenon, conta que, para entrar, os convidados ainda eram obrigados a preencher uma ficha e deixar as impressões digitais. A festa foi um sucesso estrondoso.
Georges Simenon está por inteiro neste episódio. Misto de showman com escritor clássico, mexendo com temas perenes e eternos da literatura mundial, ferrenho defensor dos rendimentos que o tornaram um dos homens mais ricos de sua época e uma verdadeira usina de produção literária: escrevia com uma velocidade, quantidade e qualidade impressionantes. Escrevia romances em uma semana e publicava vários por ano. Ao final de sua vida, deixou por volta de quatrocentos livros escritos, sendo que destes "somente" setenta e cinco eram de Maigret. Foi traduzido para mais de cinquenta línguas, vendeu mais de quinhentos milhões de exemplares, foi transposto para o cinema, televisão, teatro e quadrinhos.
Maigret, portanto, mais do que um simples personagem de literatura, faz parte do patrimônio cultural da humanidade.


CLAUDINEI VIEIRA, um infiltrado, é contista, com incursões também pelo relato policial. Publicou Desconcerto (São Paulo: Demônio Negro, 2008).

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