Noir francês

A lua na sarjeta (La lune dans le caniveau, 1983), David Goodis por Jean-Jacques Beineix.

quinta-feira, 21 de março de 2013

O CAIR DA NOITE

Este conto longo de Isaac Asimov, agora publicado no Brasil em edição autônoma (Arte e Letra, 2012), foi eleito em 1964, pelos escritores de ficção científica dos EUA, o melhor conto de todos os tempos no gênero ― e talvez seja o mais popular do autor. Partindo de uma premissa inspirada numa citação de Ralph Waldo Emerson, narra o temor de um planeta que viveu um dia de dois mil anos e finalmente vai experimentar a noite, não menos extensa. Obviamente que, depois de um dia tão longo, e vendo se aproximar a escuridão, “esta desconhecida”, aquela “humanidade” só poderia supor que estava diante do fim do mundo. A trama se desenvolve nesta perspectiva, colocando em choque quatro pilares do conhecimento humano: a ciência (representada por um cientista), a mídia (por um repórter), a religião (por um místico) e o senso comum (o povo). Nas horas que se seguem até o ocaso dos seis sóis daquele planeta, crenças banais, temores óbvios, ambições inevitáveis e convicções transitórias grassam sua humanidade, fragilizada diante do desconhecido. A bela edição em formato de bolso e capa dura tem tradução (mal revisada, com um agravante parágrafo truncado) de Ana Cristina Rodrigues e prefácio de Marcello Simão Branco, que, a despeito da vontade de redigir um texto sem juízo de valor, não consegue evitar afirmações desta natureza e que só depõem contra o gênero: “Mesmo tendo sido um escritor apenas mediano do ponto de vista literário (...), Asimov influenciou como poucos o panorama da ficção científica”. Incauto, o prefaciador não explicita quais seriam os méritos literários não cumpridos pelo autor ou os defeitos frequentes nos quais incorre, e que, segundo ele, desabonariam o estilo de Isaac Asimov. É como sempre digo: para o Brasil, que pouco lê e muito se exibe, ou o escritor é Guimarães Rosa ou não é escritor. Lamentável, inclusive para os leitores, que ficam sem saber o que ler, pois temem não ler o que há de melhor.

Publicado originalmente em Crítica Rasteira, da revista Verbo 21, em fevereiro de 2013.