Noir francês

A lua na sarjeta (La lune dans le caniveau, 1983), David Goodis por Jean-Jacques Beineix.

domingo, 30 de agosto de 2009

PACTO DE SANGUE


Baseado no romance Indenização em dobro, de James M. Cain, dirigido por Billy Wilder e com roteiro de Wilder e Raymond Chandler, o filme Pacto de Sangue consegue prender a atenção dos espectadores tanto quanto um filme hitchcockiano. O filme começa com o corretor de seguros Walter Neff (Fred MacMurray) chegando à empresa na qual trabalha, sentando à mesa do chefe e confessando que matou um homem por dinheiro e por uma mulher, mas não conseguiu o dinheiro, nem tampouco ficou com a mulher. Assim, o filme se inicia revelando o seu final, o que comprova a ideia de que o que mais importa numa narrativa não é o que nela acontece, mas como acontece. Nas primeiras cenas já sabemos qual será o término do filme, mas ele nos envolve de tal forma, que ficamos ávidos em acompanhar a história até o último momento. E o constante suspense do filme chega ao ápice na cena em que Neff recebe o chefe e amigo Keyes (Edward G. Robinson), enquanto espera pela Sra. Dietrichson (Barbara Stanwyck), mulher sedutora e calculista por quem se apaixona. Considerado o primeiro filme noir, Pacto de Sangue desenvolve uma trama que mistura amor, amizade, sedução, sexo (ainda que apenas sugerido), adultério, crime. Um filme com diálogos ácidos e primorosos. O mesmo se pode dizer da narração in off feita pelo protagonista, Walter Neff, na qual podemos ouvir, por exemplo: "Não conseguia ouvir meus próprios passos. Era a caminhada de um homem morto". Sem esquecer a pitada de humor (típica do gênero, que se notabilizou pela auto-ironia e desencanto dos personagens), na figura do analista de seguros Keyes e seus pressentimentos (seu homenzinho infalível), seu faro para assassinatos. Também chama a atenção a bonita amizade entre Neff e Keyes, motivo pelo qual Keyes, que nunca falhou com seus pressentimentos, jamais desconfiou de Neff: "Sabe porque não conseguiu solucionar este caso, Keyes? Vou lhe contar. Porque o cara que procurava estava muito próximo. Ele estava na frente da sua mesa." "Ele estava mais próximo do que isso, Walter. Eu também te amo". E aquela inversão no desfecho do filme: Keyes, que sempre tinha seu cigarro aceso por Walter, é agora quem acende, provavelmente, o último cigarro do amigo. É a ironia final. Dizem que o próprio Hitchcock, ao assistir a este filme, afirmou ter encontrado, enfim, em Billy Wilder, alguém que pudesse fazer par com a sua obra. Se ele, realmente, disse isso, quem somos nós para discordar do velho Hitch?

LIDIANE NUNES, uma infiltrada.