Noir francês

A lua na sarjeta (La lune dans le caniveau, 1983), David Goodis por Jean-Jacques Beineix.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

ELIZABETH SHORT, A DÁLIA NEGRA

Cartaz do filme, de 2006.
Há 67 anos, em 15 de janeiro de 1947, às 10:45 da manhã,  um telefonema anônimo de uma mulher conduz a polícia de Los Angeles a um terreno baldio entre a Rua 39 e a Av. Coliseu. A poucos metros da calçada, em meio ao mato tocado pelo vento, repousa o corpo despido de um moça de mais ou menos vinte anos, separado ao meio à altura do ventre. Como num filme de horror, ela apresentava um sorriso macabro, pois sua boca fora lascada quase de uma orelha a outra. Torturada, talvez ao longo de dias, com marcas em todo o corpo, fora, por fim, eviscerada, restando muito pouco dos seus órgãos internos para a análise dos legistas. Um detalhe surpreendeu a todos: além de cruel e impiedoso, o assassino era higiênico, pois lavou o corpo de tal modo, que não havia sequer uma mancha de sangue.

A moça era Elizabeth Short, de 22 anos, 1,60m, cabelos castanhos, nascida em Hyde Park, Massachusetts, EUA, em 29 de julho de 1924, sob o signo de leão. Estava em Los Angeles para se tornar atriz e ser famosa, uma estrela. Porque se vestia toda de preto, recebeu de vizinhos e transeuntes o apelido de Dália Negra. Desde que chegara a Los Angeles, mudava constantemente de endereço e procurava, junto a companhias masculinas, um romance, um sustento temporário e alguma oportunidade. Nada conseguiu, e qualquer um que a viu passar ou a usou pode ter se tornado o seu assassino.

Surpreendentemente, tudo o que se disse de Betty Short, desde que seu corpo foi encontrado, parece querer justificar o que lhe aconteceu, como se isso fosse possível. Foi dito que era confusa e volúvel, que estava em decadência, que apresentava temperamento impulsivo e não passava de uma sonhadora. Assegurou-se, ainda, que ela sentia medo, todo o tempo. Um medo de si mesma, talvez. Em sua correspondência, foram encontradas muitas cartas, algumas que ela jamais enviara, e outras que recebera. O tema era um só: o amor. E o tom, de desespero, perda, frustração, desesperança, derrota, dela para os remetentes, e destes para ela. Concluiu-se que Betty era uma moça angustiada e insatisfeita.

Todo o seu percurso em Los Angeles foi remontado, e se descobriu que ela estava sempre em trânsito. Não parava, nunca. Movia-se de um hotel para outro, de um bar para outro, na companhia de homens, mulheres e, não raro, sozinha. Um dos seus historiadores arremata, imbuído, talvez, do desejo de não deixar dúvidas quanto ao fato de que ela mesma cavou sua morte: "Incapaz de classificar pessoas e acontecimentos com discernimento, precipitava-se, com rapidez crescente, para a sua própria destruição".

O suprassumo desta teoria é o bilhete anônimo que chegou à delegacia, no curso das investigações. Depois de duas ou três frases de bravata, aquele que se denominava o Vingador da Dália Negra, e que escrevera algumas vezes à polícia,  rabiscou: "A morte de Dália foi justificada". O que ela fez e como fez justificaria que tivesse sido torturada, estuprada, sodomizada, retalhada, eviscerada, cortada ao meio, e ainda tivesse a boca rasgada de orelha a orelha...

A morte de Elizabeth Short sempre será um enigma, mas sempre será, sobretudo, uma ignomínia sem explicação nem justificativa.