Noir francês

A lua na sarjeta (La lune dans le caniveau, 1983), David Goodis por Jean-Jacques Beineix.

sábado, 22 de setembro de 2012

OS INTOCÁVEIS


Os intocáveis, de Boileau-Narcejac, pseudônimo forjado pela dupla de escritores franceses Pierre Boileau e Thomas Narcejac, é um claro exemplo do relato policial de ação. O romance conta a história de dois párias, intocáveis pela desonra: o desempregado Jean-Marie Quéré e o ex-prisioneiro Ronan De Guer. No decorrer da leitura, ficamos sabendo do assassinato do comissário Barbier, cometido dez anos antes por Ronan que, na época, era um ativista político. Após ser solto, este conta com a ajuda de um amigo da juventude, Hervé, para encontrar o paradeiro de Quéré, que, segundo Ronan, o delatou para a polícia, fazendo com que fosse preso e que a sua noiva, Catherine, grávida, cometesse suicídio. Portanto, há também uma investigação. Mas não exatamente como acontece no gênero policial de enigma. O detetive contratado por Hervé não procura o assassino do comissário Barbier, pois este já foi denunciado e punido. O leitor já conhece o assassino e a vítima. A busca é por Quéré, suposto delator. A intenção de cometer um novo crime é anunciada por Ronan desde o início da narrativa. E nós, leitores, acompanhamos toda a ação, nos convertemos em cúmplices do criminoso. E para este assassinato ― que acontece no ponto exato ― não há investigação, nem punição alguma, pois nada disso é necessário. O desfecho é totalmente previsível, como dizem alguns críticos, mas isto também não importa nem um pouco para os leitores sensíveis. O que, de fato, nos interessa é a angústia de Quéré, casado com Hélène, a quem conhecemos através das cartas que este envia para um amigo religioso. O que nos toca é a agonia de um homem desempregado, que se sente inútil e que desistiu da fé. O que nos desperta é a dor; e o desejo de vingança de um rapaz que perdeu a namorada e que apenas tem como meta a morte daquele que acredita tê-lo privado do sentimento que o guiava. O que nos emociona é o desespero, a paralisia de um antigo padre, que, consciente da sua existência absurda, deixa-se assassinar. O novo crime ou sua punição é o que menos interessa. E nem por isto o livro deixa de ser um relato policial genuíno. Apenas o seu tema central não é a elucidação de um enigma, mas, sim, o destino de duas vidas destruídas por um passado comum.

LIDIANE NUNES, uma infiltrada.

Nenhum comentário: